As lições sucediam-se. Voltava a sentir-me como os meus próprios estudantes, saltando de aula em aula, de mestre em mestre, entre a teoria mais longínqua e a prática mais próxima.
Umas eram sobre novas matérias, outros tantos olhares diferentes sobre o mesmo mundo, começando quase pelo princípio, pelos princípios, pelos termos e conceitos, pelo que há de mais básico. Tateando, testando, experimentando, alargando a base. Nem sempre compreendendo de imediato o quê e o porquê. Por vezes buscando, demasiado cedo, uma utilidade para o saber.
Em muitas outras sentia já que me embrenhava, cada vez mais profundamente, num caminho estreito, focando, entrando no domínio dos especialistas. Ascendendo de nível. Entendendo a complexidade que faz as coisas serem, afinal, mais simples. Participando em sessões que ainda há poucos anos, ou mesmo só alguns meses, seriam totalmente incompreensíveis, como se faladas em língua alheia.
Mas, ainda mais do que estender as linhas horizontais ou progredir na escala vertical, interessava-me cada vez mais pelos caminhos oblíquos, aqueles que permitem cruzar vários domínios e vários níveis, misturando saberes. Olhar para o natural de uma forma abstrata, e para o abstrato com os olhos da natureza, juntar uma pitada de arte, aqui e ali, questionar, saltar barreiras, contornar ou confrontar os que aparentam ser donos senhoriais de alguns destes domínios
Porém, foi só na era newtoniana que esta nova coabitação [entre a Física e a Matemática] conduziu a um casamento genuíno. Os “Principia” de Newton, escusado será afirmá-lo, eram uma obra matemática par excellence (...). No mínimo dos mínimos um estudante de Física precisava de estar bem preparado em Geometria de secções cónicas e, de preferência, também em cálculo. Como resultado disso, a partir do momento em que a Cosmologia de Newton começou a ser tomada a sério nas universidades da Europa continental, o curso de Física teve de ser prefaciado pelo ensino pormenorizado da Matemática. (*)
Tanto por saber, tanto para aprender, tanto para ensinar, tanto para descobrir. E tanto tempo que é necessário! Uma tensão permanente entre aprender algo diferente, algo novo, ou aprofundar um caminho já iniciado. Entre o todo e apenas uma parte. Entre ouvir muitos mestres ou discutir, quase de igual para igual, com apenas um ou dois.
Apercebo-me que estes dilemas não são só meus, mas também dos próprios mestres. Debatem-se com o que ensinar, como ensinar, em que sequência. O que é mais relevante e o que pode ser acessório. Tendo eles opiniões diversas sobre o fundamento e o método, sobre o papel de cada disciplina, sobre o uso do tempo.
Não sei se estas questões terão resposta durante o próximo século, o dezanove, que já se avizinha …
Uma viagem à boleia de Newton, um jogo de Nestore Mangone e Simone Luciani, Ediciones Mas que Oca (2018) sob licença de Cranio Creations.
(*) História da Universidade na Europa, Vol. II – As Universidades na Europa Moderna (1500-1800), Coordenação de Hilde de Ridder-Symoens, Imprensa Nacional Casa da Moeda (2002).
(*) História da Universidade na Europa, Vol. II – As Universidades na Europa Moderna (1500-1800), Coordenação de Hilde de Ridder-Symoens, Imprensa Nacional Casa da Moeda (2002).
Sem comentários:
Enviar um comentário